quarta-feira, 19 de junho de 2013

O MOSTRO FOI PARA A RUA



O que se assiste não é um movimento político, mas social e cuja principal característica é a ausência de comando.  O Brasil nunca viu nada igual. As conseqüências são imprevisíveis.
O movimento se alastra por todo o país, até em cidades de médio porte. Apesar de São Paulo, Rio, Porto Alegre, Belo Horizonte e muitas outras capitais e principais cidades do país terem revogados os aumentos nas passagens,  o povo continua nas ruas protestando por todo o Brasil. O quadro da situação é muito preocupante, porquanto os vândalos e baderneiros continuam saqueado e depredando bens públicos e privados.
  

O MOSTRO FOI PARA A RUA

Hélio Gaspari, Folha de SP (19/06/13)
“Em dezembro de 1974, a oposição havia derrotado a ditadura nas urnas, elegendo 16 dos 21 senadores, e o ex-presidente Juscelino Kubitschek estava num almoço quando lhe perguntaram o que acontecia no Brasil.
- O que vai acontecer, não sei. Soltaram o monstro. Ele está em todos os lugares.
Abaixou-se, como se procurasse alguma coisa embaixo da mesa e prosseguiu:
- Ele está em todos os lugares, aqui, ali, onde você imaginar.
- Que monstro?
- A opinião pública.
Dois anos depois JK morreu num acidente de automóvel e o monstro levou-o no ombros ao avião que o levaria a Brasília. Lá ocorreu a maior manifestação popular desde a deposição de João Goulart.
Em 1984 o general Ernesto Geisel estava diante de uma fotografia da multidão que fora à Candelária para o comício das Diretas Já.
- Eu me rendo --disse o ex-presidente, adversário até a morte de eleições diretas em qualquer país, em qualquer época.
Demorou uma década, mas o monstro prevaleceu. O oposicionista Tancredo Neves foi eleito pelo Colégio Eleitoral e a ditadura finou-se.
O monstro voltou. O mesmo que pôs Fernando Collor para fora do Planalto.
No melhor momento de seu magnífico "Pós Guerra", o historiador Tony Judt escreveu que "os anos 60 foram a grande Era da Teoria". Havia teóricos de tudo e teorias para qualquer coisa. É natural que junho de 2013 desencadeie uma produção de teorias para explicar o que está acontecendo. Jogo jogado. Contudo, seria útil recapitular o que já aconteceu. Afinal, o que aconteceu, aconteceu, e o que está acontecendo, não se pode saber o que seja.
Aqui vão sete coisas que aconteceram nos últimos dez dias:
1) O prefeito Fernando Haddad e o governador Geraldo Alckmin subiram as tarifas e foram para Paris, avisando que não conversariam nem com os manifestantes. Mudaram de ideia.
2) Geraldo Alckmin defendeu a ação da polícia na manifestação de quinta-feira passada. Mudou de ideia e pacificou sua PM.
3) O comandante da PM disse que sua tropa de choque só atirou quando foi apedrejada. Quem estava na esquina da rua da Consolação com a Maria Antônia não viu isso.
4) Dilma Rousseff foi vaiada num estádio onde a meia-entrada custou R$ 28,50 (nove passagens de ônibus a R$ 3,20).
5) O cartola Joseph Blatter, presidente da Fifa, mandarim de uma instituição metida em ladroeiras, achou que podia dar lição de moral aos nativos. (A Viúva gastará mais de R$ 7 bilhões nessa prioridade. Só no MaracanãX, torraram R$ 1,2 bilhão.)
6) A repórter Fernanda Odilla revelou que o Itamaraty achou pequena a suíte de 81 m² do hotel Beverly Hills de Durban, na África do Sul, e hospedou a doutora Dilma no Hilton. (Por determinação do Planalto, essas informações tornaram-se reservadas e, a partir de agora, só serão divulgadas em 2015.)
7) A cabala para diluir as penas dadas aos mensaleiros que correm o risco de serem mandados para o presídio do Tremembé vai bem, obrigado. O ministro Dias Toffoli, do STF, disse que os recursos dos réus poderão demorar dois anos para ir a julgamento.

"País mudo é um país que não muda".
E outro, dirigido à polícia: "Não disparem contra meus sonhos".
(18/06/13): SEXTO DIA DE PROTESTOS EM SP amanhece com novos protestos por moradia, reajuste salarial e contra tarifa.

Após noite violenta, avenidas da capital e região voltam a receber manifestantes. Bloqueios ocorreram na avenida M'Boi Mirim e nas rodovias Anchieta e Régis Bittencourt

Após as manifestações da noite de terça-feira (18), em São Paulo, terminarem com ataque à prefeitura e saques , o dia de hoje começou com novos protestos.  Funcionários da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), por exemplo, protestam por melhores salários e deixaram de montar faixas reversíveis na Radial Leste, ponte das Bandeiras, avenida Santos Dumont, avenida Tiradentes e estrada do M’Boi Mirim.
Ontem: Protesto em São Paulo se divide entre passeata pacífica e atos de vandalismo
Ato na Anchieta, região de São Bernardo do Campo, contra a tarifa e melhores condições de moradia.
Além disso, no Largo de Piraporinha, região sul da capital, a estrada do M’Boi Mirim está interditada, no sentido centro, por cerca de 300 manifestantes filiados ao Movimento dos Sem-Teto e Movimento pela Moradia. Eles protestam contra o aumento da passagem e fazem reivindicações locais, como melhorias no sistema de saúde. O trânsito já está carregado na região.
Segundo o coordenador da Periferia Ativa, Gilson Alves Garcia, a pauta de reivindicação é ampla. Eles pedem, além da diminuição da tarifa, a duplicação da Avenida M' Boi Mirim, a extensão do metrô até os bairros da periferia e melhoria das condições do transporte coletivo.
Anchieta
A Rodovia Anchieta também foi bloqueada por um grupo de manifestantes na altura do km 23, sentido São Paulo, na região de São Bernardo do Campo. Pneus foram queimados durante a formação de barricadas para a interrupção do trânsito no local. A Polícia Militar acompanhou a manifestação e liberou a pista por volta das 9h.
A retenção, segundo a concessionária que administra a via, não chegou a ser um grande transtorno porque foi feito um desvio para o acesso à Rodovia dos Imigrantes. Da Anchieta, os manifestantes seguiram em direção ao Paço Municipal, onde fazem um protesto neste momento.
Taboão da Serra
A Rodovia Régis Bittencourt, principal ligação entre o sul e o sudeste do país, foi interditada nos dois sentidos por volta das 9h30, na altura do km 270, próximo à região de Taboão da Serra, em mais um ato de protesto contra o aumento da tarifa do transporte público.
A Autopista, concessionária que administra a rodovia, informou que por volta das 9h45 havia 3 km de congestionamento no sentido São Paulo. Os manifestantes tinham saído em passeata da avenida Francisco Morato, na zona sul da capital, e tomaram as pistas da estrada formando uma barreira. A rodovia foi liberada às 10h05. 
Fontes: Agência O Estado e Agência Brasil
Míriam Leitão, O Globo, 19/06/13
“Um surto de manifestação como o que se espalhou pelo Brasil nos últimos dias nunca tem uma explicação simples. É preciso humildade para admitir que ele não está inteiramente compreendido. Existem pistas. Ele tem a vantagem de quebrar a convicção de que o brasileiro suportaria todo o desaforo sem reagir: da deterioração dos costumes políticos ao desconforto econômico.
Há razões conjunturais e outras mais antigas para justificar qualquer manifestação de protesto no Brasil. A inflação está alta há muito tempo, o nível de inadimplência cresceu e isso eliminou o amortecedor que o crédito vinha exercendo, o desemprego de jovens chega a quase 16% em São Paulo.”
“Com a explosão das manifestações pelo país, tropas do Exército de Brasília estão recebendo treinamentos específicos, desde sábado, para aplicá-los durante os protestos, caso as Forças Armadas sejam convocadas a ir para a rua”, informa Lauro Jardim, VEJA, 19/06/13
            Por que o Brasil e agora?
JUAN ARIAS/EL PAÍS, Espanha (18/06/13)
“Está gerando perplexidade, dentro e fora do País, a crise repentina que eclodiu no Brasil com o surgimento de manifestações de rua, primeiro em cidades ricas como São Paulo e Rio, estendendo-se por todo o País e envolvendo brasileiros no exterior.
No momento há mais perguntas para se entender o que está ocorrendo do que respostas. Há apenas um consenso de que o Brasil, até agora invejado internacionalmente, vive uma espécie de esquizofrenia ou paradoxo que ainda precisa ser analisado e explicado.
Iniciemos com as perguntas:
Por que surge agora um movimento de protesto como os que vêm ocorrendo em outros países do mundo, quando durante 10 anos o Brasil viveu anestesiado pelo seu sucesso compartilhado e aplaudido mundialmente: O Brasil está pior hoje do que há 10 anos? Não, está melhor. Pelo menos está mais rico, tem menos pobres e aumenta o número de milionários. Está mais democrático e menos desigual.
Por que se protesta nas favelas onde os habitantes viram sua renda duplicada e recuperaram a paz que lhes fora roubada pelo narcotráfico?
Por que, de repente, levantaram-se em pé de guerra os indígenas que já têm 13% do território nacional?
Os brasileiros são mal agradecidos àqueles que melhoraram sua vida?
A resposta a essas perguntas que deixam muita gente, a começar pelos políticos, perplexa e assombrada, poderia se resumir em poucas questões:
Querem políticos menos corruptos; querem menos desperdício em obras que consideram inúteis quando ainda faltam casas para 8 milhões de famílias; querem uma justiça com menos impunidade; querem uma sociedade menos abismal nas suas diferenças sociais. Querem ver na prisão os políticos corruptos.
Querem o impossível? Não. Ao contrário dos movimentos de 68, que queriam mudar o mundo, os brasileiros insatisfeitos com o já alcançado querem que os serviços públicos sejam como os do primeiro mundo. Querem um Brasil melhor. Nada mais.
Escutei alguns afirmarem: "Mas o que mais quer essa gente?" A pergunta me lembra a de algumas famílias onde, depois de darem tudo aos filhos, segundo elas, eles se rebelam.
Que o façam, isso sim, sem mais violência, pois violência já sobra nesse maravilhoso país que sempre preferiu a paz à guerra. E que não se deixem cooptar por políticos que tentarão se envolver no seu protesto para esvaziá-lo de conteúdo.”       

Nenhum comentário:

Postar um comentário